A Creatina pode prejudicar a Função Renal?

Creatina e funcao renal

A descoberta da creatina se deve a um cientista francês, onde no ano de 1835 foi relatado um novo constituinte orgânico nas carnes, denominado no momento de creatina. Contudo, somente em 1847 que a creatina foi confirmada nas carnes, assim como a primeira hipótese de que animais que tinham que caçar para se alimentar tinham em média, 10 vezes mais creatina sobre os animais em cativeiro. Na década de 90, as pesquisas sobre a suplementação de creatina aumentaram e isso se deve, pelo fato de que campeões olímpicos das olimpíadas de Barcelona em 1992 relataram utilizar a creatina. Desde então, seu uso é cercado por dúvidas como o tempo de suplementação, se antes ou após o treinamento, administração e segurança.

 

Supostas acusações da Creatina

 

Em um estudo de caso de nefrologistas britânicos publicado no The Lancet, associou-se fortes evidências de que a creatina fosse responsável pela deterioração na função renal de lutadores americanos com idade universitária (Pritchard; Kalra, 1998). Em 2006 foi a vez da creatina (15 g/semana por 6 semanas) ser a principal causa para um quadro de insuficiência renal aguda e nefrite intersticial aguda, em um homem de 24 anos (Thorsteinsdottir, et al, 2006). Outro estudo de caso de 2007, um bodybuilder desenvolveu a síndrome do compartimento das coxas e pernas bilateralmente, o que exigiu intervenção cirúrgica. O relato mostrou que nos últimos 4 meses o competidor utilizava 80 g/dia de creatina, o que corresponde 4 vezes a dose recomendada no carregamento (20 g/dia) (Do; Bellabarba; Bhananker, 2007). Vale ressaltar que estudos de caso não traçam uma relação causa e efeito, por não ser um estudo clínico controlado, embora traga a tona temas para a comunidade científica que foram e publicados posteriormente.

 

Estudos que analisaram a suplementação de Creatina e sua Segurança

 

Estudos bem controlados foram feitos posteriormente às “afirmações” de casos que até hoje confundem em relação a sua segurança da função renal e hepática. Analisando atletas saudáveis Poortmans e Francaux (1999) não encontraram evidências que pudessem afirmar os efeitos prejudiciais da função renal com a creatina entre 10 meses a 5 anos. Também não foram visto alterações nas funções renais e hepática em grupos suplementados com creatina monohidratada (20 g/dia por 7 dias e 0,03 g/kg por 53 dias até o término do estudo) com resultados dos indivíduos dentro das normalidades após exames bioquímicos (Carvalho; Molina; Fontana, 2011). Recentes estudos do grupo de Bruno Gualano na USP, investigaram a segurança da suplementação de creatina em diferentes patologias e grupos. Analisando indivíduos treinados em exercício resistido que consumiam dietas hiperproteicas ( ≥ 1,2 g/kg/dia de proteína) por 12 semanas e que consumiam creatina (20 g/dia nos 5 primeiros dias e 5 g/dia no restante do estudo) não foram notados alterações na taxa de filtração glomerular (TFG) (Lugaresi, et al, 2013). Em 2008, indivíduos sedentários saudáveis que participaram de um treinamento aeróbio por 3 meses, suplementando creatina (aproximadamente 10 g/dia), também não apresentaram disfunção renal (Gualano, et al, 2008a), assim como o incrível estudo do jovem de 20 anos com apenas 1 rim que consumia uma dieta hiperproteica (2,8 g/kg/dia de proteína) que suplementou creatina por 35 dias (20 g/dia em 5 dias e 5 g/dia nos 30 seguintes) e não foi notado mais uma vez alteração na TFG (Gualano, et al, 2010).

Desta forma, foi visto que a suplementação de creatina pode ser considerada segura quando administrada por indivíduos saudáveis na fase de carregamento (20 g/dia por 5 dias) e a fase de manutenção (≤ 3 g/dia) (Yoshizumi; Tsourounis, 2004). A maioria dos estudos clínicos disponíveis até o momento, não encontraram incidência de efeitos colaterais a função renal, hepática, cardíaca ou muscular  (Persky; Rawson, 2007; Gualano, et al, 2008b). De acordo com o posicionamento da International Society of Sports Nutrition (ISSN) não há evidências científicas suficientes de que, o uso da creatina a curto ou longo prazo, possa trazer qualquer efeito prejudicial sobre indivíduos saudáveis (Buford, et al, 2007).

 

Considerações finais

 

Em nenhum dos estudos iniciais, que julgaram a creatina como autora da deterioração renal ou outras complicações, foi mostrada que creatina foi utilizada, quais eram as dietas dos mesmos e outras informações necessárias para afirmar que a creatina pudesse ser a “autora” dos casos de complicações renais. Diante do alto número de estudos disponíveis na literatura, se confirma que a creatina tem baixo poder nefrotóxico e hepatotóxico por falta de estudos controlados, sendo um dos suplementos mais seguros do mundo quando administrados em indivíduos saudáveis e por um profissional qualificado e atualizado com a ciência.

 

Referências Bibliográficas

Pritchard, N. R., Kalra, P. A. (1998). Renal dysfunction accompanying oral creatine supplements. Lancet, 351, 1252-3.

Thorsteinsdottir, B., Grande, J. P., Garovic, V. D. (2006). Acute renal failure in a young weight lifter taking multiple food supplements, including creatine monohydrate. J Ren Nutr, 16, 341-5.

Carvalho, A. P. P. F., Molina, G., Fontana, K. E. (2011).Suplementação com creatina associada ao treinamento resistido não altera as funções renal e hepática. Rev Bras Med Esporte, 17(4), 237-41.

Do, K. D., Bellabarba, C., Bhananker, S. M. (2007). Exertional rhabdomyolysis in a bodybuilder following overexertion: a possible link to creatine overconsumption. Clinical Journal of Sport Medicine, 17(1), 78-9.

Poortmans, J. R., Francaux, M. (1999). Long-term oral creatine supplementation does not impair renal function in healthy athletes.Medicine and science in sports and exercise, 31, 1108-10.

Yoshizumi, W. M., Tsourounis, C. (2004). Effects of creatine supplementation on renal function.Journal of herbal pharmacotherapy, 4(1), 1-7.

Persky, A. M., Rawson, E. S. (2007). Safety of creatine supplementation. Sub-cellular biochemistry. 46, 275-289.

Buford, T. W., Kreider, R. B., Stout, J. R., Greenwood, M., Campbell, B.; Spano, M., Ziegenfuss, T., Lopez, H., Landis, J., Antonio, J. (2007). International Society of Sports Nutrition position stand: creatine supplementation and exercise. Journal of the International Society of Sports Nutrition. 4, 1-8.

Gualano, B., Ugrinowitsch, C., Seguro, A. C., Lancha Junior, A. H. (2008b). A suplementação de creatina prejudica a função renal?.Revista Brasileira de Medicina do Esporte. 14(1), 68-73.

Lugaresi, R., Leme, M., de Salles Painelli, V., Murai, I. H., Roschel, H., Sapienza, M. T., Lancha Junior, A. H., Gualano, B. (2013). Does long-term creatine supplementation impair kidney function in resistance-trained individuals consuming a high-protein diet. J Int Soc Sports Nutr, 10 (1), 1-6.

Gualano, B., Ugrinowitsch, C., Novaes, R. B., Artioli, G. G., Shimizu, M. H., Seguro, A. C., Harris, R. C., Lancha Jr, A. H. (2008a). Effects of creatine supplementation on renal function: a randomized, double-blind, placebo-controlled clinical trial.European journal of applied physiology, 103(1), 33-40.

Gualano, B., Ferreira, D. C., Sapienza, M. T., Seguro, A. C., Lancha, A. H. (2010). Effect of short-term high-dose creatine supplementation on measured GFR in a young man with a single kidney.American Journal of Kidney Diseases, 55(3), e7-e9.

 

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Eduardo Marinho
Eduardo é de Maceió, Nutricionista (CRN6 -23413/P), Pós-Graduando em Nutrição Esportiva. Praticante de musculação e atleta de Handebol. Gosta de escrever sobre assuntos relacionados s sua área de estudo, disponibiliza no DT com o intuito de contribuir com a comunidade.

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